quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Sobre a Doutrina da Predestinação - Argumentos Filosóficos (Parte 1)



Todas as pessoas ligadas ao universo da religião já foram defrontadas com o tema da Predestinação.
O cristianismo convive com este impasse teológico há muitos séculos.
Na tentativa de desvendar alguns problemas filosóficos dessa Teoria, teólogos e filósofos se revezaram em fóruns e debates extensos e complexos. 

Um assunto recorrente na Doutrina da Predestinação é o da liberdade humana.
Até que ponto há liberdade no universo?
Se o universo foi criado por Deus, que não pode errar nem permitir que aconteça qualquer coisa que o frustre, por que há tanta perversidade, vícios, tragédias e  tanta maldade no mundo?
Os seres humanos são livres para optar entre o bem e o mal?
Se os seres humanos são frutos do pecado, a  liberdade humana se resumiria em escolher entre qual tipo de maldade será praticada ou evitada?

Deus teria criado um mundo já com todas as ações boas e malignas prontas e predeterminadas, para que no fim Ele se afirmasse por sua sabedoria?

A teologia cristã iniciou seu trabalho sistemático e filosófico sobre a liberdade com Santo Agostinho.
Agostinho passou a ensinar que os seres humanos não possuem verdadeira liberdade. E por estarem presos, todo relacionamento entre Deus e os seres humanos acontece por coerção, e que a força e o amor não são incompatíveis.

No Universo Protestante, Martinho Lutero e João Calvino pregavam a Doutrina Pré-derminista.
Também estes dois teólogos não acreditavam na plena liberdade humana.
Mas foi João Calvino quem retomou o discurso de Agostinho e lhe deu consistência teológica.
Ele acreditava que o universo está pronto (Soberania), os atos de todas as criaturas foram pré-determinados pelo criador na eternidade passada (Providência) e o destino de cada indivíduo, decretado e selado (Predestinação).


Caso concordemos com a Doutrina da Predestinação, podemos fazer ainda algumas perguntas:
Até que ponto a humanidade deve abrir mão da Liberdade e do Livre Arbítrio como valores?
Porque seria eu obrigado a acreditar que meu futuro já esteja pré-definido se nem mesmo tenho a dimensão da consequencia de meus atos?
Porque Deus, sendo Bom e Justo, determinou que uns viriam ao mundo para sofrer enquanto que outros seriam protegidos de todos os infortúnios?
Seria compativel essa imagem de um Deus que abandona uns e protege outros, com o Deus da Bíblia? 

A clássica definição de Joao calvino sobre o Tema da Predestinação se encontra na Obra "Institutas da Religião:

Chamamos de Predestinação ao eterno decreto de Deus, pelo qual ele determinou em si mesmo o que ele quis que todo indivíduo do gênero humano viesse a ser. Porque eles não são criados todos com o mesmo destino, mas a alguns é pré-ordenada a vida eterna e para outros a condenação eterna. Portanto, sendo criada cada pessoa para um ou outro destes fins, dizemos que é predestinada ou para a vida ou para a morte”.

A liberdade humana, portanto, não existe dentro destes conceitos.
Cada um nasce para cumprir o propósito previamente decretado por Deus.

Outro clássico autor Protestante B. B. Warfield, também discipulo de Calvino, argumentou a favor da Predestinação:

“Não podemos pensar em Deus senão como um Ser que determina tudo o que acontece no mundo, como resultado do seu ato criador. Todas as coisas sem exceção estão dispostas por Ele, e sua vontade é a última palavra para tudo o que acontece na Terra. É ele que dirige os passos dos homens, quer eles saibam ou não”.


Deve-se admitir que nesse modelo, os raciocínios de Agostinho e de Calvino são coerentes. Eles contêm uma lógica filosoficamente inquestionável.

Resta perguntar se esse é o Deus da Bíblia...
O Deus pregado por Calvino seria o mesmo que Jesus revelou aos homens?
Existe ainda uma questão que teima não calar: seus argumentos são compatíveis com as Escrituras?


A igreja cristã deve ser a primeira a defender e justificar a Liberdade como o dom mais precioso...
e que, acreditar nela, é mais nobre e mais sensato do que enxergar a vida humana presa a um fatalismo histórico ou a desígnios divinos.

Na doutrina Predestinacionista já no primeiro ato criador de Deus, tudo já estava decidido.
A queda de Adão, o adultério de Davi, o estupro maldoso, o holocausto de Hitler, o genocídios acontecidos na História, o tiro que matou o suicida, o intocável que morre nas calçadas pobres e sujas do mundo.

A constituição genética de todos os seres humanos foi escrita e determinada por Deus e todos já nasceram com suas vidas prontas. Deus, inclusive as contempla como já acontecidas.

Para a Doutrina Predestinacionista, Deus não apenas decretou, como observa o passado, o presente e o futuro de uma só vez.
Tudo está pronto. Seria como se ele estivesse, a partir da eternidade, contemplando a história como uma linha já traçada e completada.

Para essa teologia, nem mesmo a aleatoriedade do universo foge do controle divino, pois Deus gerencia cada pequeno evento. Assim, o destino existe e é imutável. Tudo e todos já nascem presos a ele.

Na Teologia Predestinacionista o determinismo fatalista passa a ser concebido como uma verdade além da razão e dos argumentos.
E os humanos não podem questionar nada, pois Deus não tem satisfações a dar do que ele pré-decretou desde sempre.

Continua nas próximas horas....


Frei Eduardo F. Melo
Santa Teresa - ES
16 de setembro- 2010.

Um comentário:

  1. Ahhhh... Desse jeito eu entendo melhor, pra não deixar de citar, vai aí mais uma do Paulo "Tuelho" =D :

    "O homem deve escolher - e não aceitar- o seu destino."

    ^^

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