terça-feira, 25 de janeiro de 2011

O velho e o rio.


Poesia da saudade.
Ontem pela manhã, eu caminhava sozinho sobre a margem de um rio.
Era calmo, límpido e tácito, e repercutia o silêncio carcaterístico da solidão no serrado.

De pé recostado a uma árvore, estava um velho
de chapéu de palha, barba grande e cabelos brancos.
Suas roupas estavam sujas, seus olhos eram verdes,
a pele amarelada.
Ele acendia, como num antigo rito, seu cigarro de palha.

Meio que de repente, o velho virou-se em minha direção e me olhou em silêncio.
Era a hora em que os primeiros raios do sol reluziam.
O céu avermelhado, os pássaros  brancos e o som de uma antiga usina desativada
eram as únicas testemunhas daquele nostálgico encontro.

Eu lhe disse o porque estava ali.
Como dois amantes que entendem a melodia do universo,
Ele me pediu que lhe cantasse uma música que lembrasse o seu passado.
E então eu cantei para ele os versos de um antigo poeta português, contemporâneo meu:

"Com a pena da saudade, rabisquei num papelão
versos soltos da poesia
fagulhas da inspiração.
abrandei meu pensamento com sinfonias primaverais
Na saudade e nos acordes, fiz meu verso e meu cantar."

Ele percebeu que minhas idéias destilavam o perfume da saudade.
- palavra constante dentro aqui, disse eu, e logo me virei para a outra margem.

O velho me perguntou se de onde eu vinha,
a saudade era querida.
Eu disse: - sim senhor. Lá no mundo de onde eu venho, a saudade é uma constante.
Deixado eu tinha, e dentro dela, havia carregado quem guardava no coração.

Eu então recitei para ele, um antigo verso que volteava agora em minha lembrança
e que tivera sido o verso mais marcante, quando a Floresta que tanto amo, para trás deixei:

Há um rio que passa embaixo de minha casa.
Esse rio, dizem, é o tempo.
E minhas lembranças são como os peixes nadando ao invés da corrente.
Acredito, sim, por educação, mas não creio.

Minhas lembranças são como os pássaros.
Eles voam mais rápidos que meu pensamento.
Tento alcançá-los, mas não consigo.
Me guio então pelas nuvens, minhas lembranças.
Mas elas também escapam com o vento.

Então, acordado daquele sonho que me tomara a noite,
decidi deixar as lembranças e os pássaros voarem.
Um dia eles acabarão voltando.
Mas então serei outro.
Aí..eles terão de partir novamente.

E o velho se foi para o sol transfigurado
enquanto eu ali parado, escrevi esta canção.

Frei Eduardo F.
No silêncio e na solidão do serrado de Goiás.
24 de janeiro - 2011.

5 comentários:

  1. Bom dia!!!
    MAis uma vez parabéns por mais esta bela obra,talvez seja capaz de imaginar qto bem fazem essas palavras a corações e almas confusas.E lendo-as percebi como estranha é essa Sr ,confirma felicidade e amor, mas todas as vezes que nos reportamos a ela fica aquele estranho e inexplicado sentimento aí apenas a afirmamos Saudade!!!
    Na prece silenciosa meu coração pede a Deus proteção e continuidade dessa luz que se tornastes em nossas vidas.
    Salamaleiko!!

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  2. A perfeição se torna muito mais próxima quando escrevemos o que sentimos ne? As palavras brotam com muito mais facilidade. Lindo texto.... e eu adorei esse poema ai no final...lembranças vão e voltam, mas...sempre voltam! :)
    Saudade! Nhááá

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  3. Ao ler o título, logo me veio: "A teceira margem do rio" de Guimarães Rosa. A figura do pai, a angústia do menino, a saudade da família, a questão do tempo etc. O velho e o rio, duas imagens que mostram nitidamente a passagem do tempo. Que Deus abençoe os nossos idosos! A paisagem pode não ser a mesma, mas o rio segue, tem que seguir.
    Paz e Bem
    Ana Paula (Paróquia Santo Cristo dos Milagres)

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  4. Querida ana Paulaa..
    por favor, me empreste essa obra do Guimaraes Rosa.
    Voce acredita em osmose por definição?
    talvez estejam lá os arquétipos recorrentes de minha poesia sem verso...
    hehehehehe..
    e pode acreditar. o texto saiu de supetão aqui hoje pela manha...
    inspiração do sol que nascia e invadia minha janela quebrando meu sono..

    hehe..
    Grande ABRAÇO.
    a paz.FRei.

    ________________________

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  5. Frei querido,
    Lindo texto, expressa com clareza homem puro e humano que você é, e a saudade enorme que traz dentre de ti.
    "Saudade é amor que fica".

    Saudades sem fim. Forte abraço.

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