quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

IMAGENS DA JANELA.


Houve um tempo em que minha janela se abria para um chalé.
Eu era criança,
achava essa ilusão maravilhosa e
sentia-me completamente feliz. Parecia um sonho!


Houve um tempo em que a minha janela dava para um rio.
Nele oscilava um barco.
Um barco carregado de flores.
Para onde iam aquelas flores?
Quem as comprava?
Em que jarra… em que sala, diante de quem brilhavam,
na sua breve experiência?
E que mãos as tinham criado? E que pessoas iam sorrir de
alegres ao recebê-las?

Eu não era mais criança,

porém minha alma ficava completamente feliz.

Houve um tempo em que a minha janela se abria para um terreiro..
onde uma vasta mangueira alargava sua copa redonda.
À sombra da árvore, numa esteira,
passava quase o dia todo sentada
uma mulher, cercada de crianças.
E contava histórias.


Eu não podia ouvir, da altura da janela...
e mesmo que a ouvisse, não entenderia,
porque isso foi muito longe, num idioma difícil.
Mas as crianças tinham tal expressão  no rosto,

e às vezes faziam com as mãos movimentos tão compreensíveis,
que eu participava do auditório,
imaginava os assuntos e suas peripécias e me sentia completamente feliz.
 

Houve um tempo em que na minha janela havia um pequeno jardim grande e seco.
Era um tempo de estiagem,
de terra esfarelada, e o jardim parecia morto.


Mas todas as manhãs vinha um pobre
homem com um balde e em silêncio,
ia atirando com a mão umas gotas e água sobre as plantas.
Não era uma rega:
era uma espécie de aspersão ritual,
para que o jardim não morresse.


E eu olhava para as plantas...
para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros
e meu coração ficava completamente feliz.

Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas...

que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas (!)
e outros finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.


No dia de meu nascimento.
Um brinde a esta grande escritora, fazendo delas, minhas palavras.
Cecília Meirelles.

Um comentário:

  1. Frei,
    Enquato lia, lembrei de um outro autor que com a mesma simplicidade fala que o ser humano está sempre mudando: "... o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam." (Guimarães Rosa – Grande Sertão: Veredas).
    Muitas pessoas passam pela vida sem se dar conta das transformações, sem olhar as suas janelas.
    Paz e Bem!
    Ana Paula (Paróquia Santo Cristo dos Milagres).

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