sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Morte e Vida na Fronteira - Deus e o mundo.




Um paradigma teológico central.
Já faz tempo que desejo escrever sobre uma das mais belas atribuições da teologia: conceber a Deus como Pai, como puro amor e bondade. Estou convencido de que essa afirmação ( Deus, antes de tudo é pai!) pode – e talvez deva – reconfigurar toda a teologia: oferecer uma outra visão, uma outra perspectiva sobre todos os temas fundamentais da fé cristã.

Comunicar a Fé no mundo hoje!
Creio que o melhor modo de poder dizer alguma coisa ao mundo sobre Deus seja partindo desta afirmativa da paternidade divina. Não é o caminho das teorias aquele que poderá encontrar a saída para a atual situação de "confusão" no universo da religião, senão o da experiência, o da vivência: nela é mais fácil que todos nos encontremos; e, se asseguramos algo assim na igreja, não seria difícil ir elaborando uma nova configuração teórica sobre o próprio Deus.

O Fundamento maior da religião.
As religiões existem para ajudar o maior número de pessoas possíveis a encontrarem uma pátria em Deus.

Infelizmente também a religião vê-se muitas vezes carregada com um peso que não é dela: experimentada como imposição mais ou menos repressiva. Aparece como religião do dever, da limitação da existência e da liberdade humana. A religião da exigência, que não permite descansar…Falso!

"O peso da vida não é o peso da religião, senão o peso da existência como tal. É o fato de ser humano, de se realizar como pessoa, aquilo que acaba sendo difícil."

Ser "pessoa": eis aí a exigência, o chamado que leva para frente, a tarefa e a dura realidade da construção da liberdade.

Religião e libertação.
A religião vem, justamente, tornar mais suportável essa tarefa. Oferece a companhia do Senhor, seu amor, seu apoio, sua promessa, sua luz, seu projeto seguro… 
A pessoa religiosa tem de fazer o mesmo que os demais – ser pessoa – , porém conta para isso com a alegria de magnífica ajuda. A tem de ser vista como Evangelho, como boa notícia, senão corre o risco de se tornar um mero mecanismo funcional da história humana.

Daí a conclusão de que tudo o que impede de ver a religião como graça, como libertação, como fonte de alegria…pode constituir-se numa deformação de seu objetivo maior, ou até mesmo uma ‘blasfêmia’.

"Deus tem de aparecer sempre como ‘cúmplice’, como apoio, como ajuda na dura tarefa da construção da Vida. Ver sua mão estendida como peso que pune o ser humano é realmente a grande perversão, o grande mal-entendido da história da humanidade".

O cristão e o mundo - outro olhar.
O cristão não tira nada dos demais: oferece-lhes unicamente ajuda; não pretende impor-lhes uma carga: só quer dar uma mão; não os condena: oferece-lhes salvação; não os inveja: apenas sente pena de que careçam de algo tão magnífico; não quer mostrar-se agressivo, nem interessado, nem ansioso: alegra-se com sua possível felicidade, porém, gostaria que esta fosse plena…

"Não há, pois, nada duro que seja imposto ao ser humano pela religião: a dureza vem-lhe do próprio fato de ser humano; a dureza é o quinhão da existência humana: liberdade limitada. Nada traz a religião, senão ajuda, alívio e libertação para quem se encontra nessa situação."

Religião e opção fundamental da pessoa.
Essa ajuda divina no meio das crises humanas consiste, justamente, numa comunhão pessoal, num destino plenificador. A dureza da vida precisa ser assumida no seio da pessoa humana como visualização de um grande projeto de felicidade, de salvação. 

Deus precisa de novo ser visto como amor que salva, como refúgio seguro, como pai a quem se pede auxílio, como mãe que cuida e que ama ‘porque assim’ o faz, como aquele que, faz com que tudo esteja bem, em ordem.

"Deus é mão estendida para nosso exclusivo interesse: causamos dano a nós mesmos quando não O acolhemos; preparamos para nós trágica armadilha, tornando mais aguda a dureza da vida, quando cremos torná-la mais fácil."

Deus sofre em seu amor ao ver que aquele que é amado se recusa a ser feliz. 
Não podemos imaginá-lo como se estivesse preparando um castigo, quando a única coisa que pretende é presentear-nos com um dom, criar uma felicidade. O castigo é precisamente recusar o dom, privando-se da felicidade. 

O inferno é como morte, como ‘nada’. 
Não é castigo nem vingança. 
É fim.
E quantos o vivem assim? 


Texto retirado do Livro 
"Recuperar a Crianção"
Andrés Torres Queiruga
Editora Paulus, 2005.

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