sexta-feira, 16 de julho de 2010

Sobre a dor do câncer- Depoimento do Vice-Presidente.



"A humildade não está na pobreza, não está na indigência, na penúria, na necessidade, na nudez e nem na fome".

Admiro a capacidade de superação do José Alencar. 
Desde que começamos a acompanhar sua batalha contra o cancêr pelos meios de comunicação, creio que não há uma só pessoa que ainda veja este homem da mesma maneira.
Na semana passada, o vice-presidente da República, de 77 anos, deu início a mais uma batalha contra a doença. É o 11º tratamento ao qual se submete.
Creio que alguns insights desta reportagem podem ser interessantes para re-pensarmos o significado do sofrimento de quem está com câncer.

Boa Leitura a Todos.
Frei Eduardo F. Melo

ENTREVISTA: Desde quando o senhor sabe que, do ponto de vista médico, sua doença é incurável?
José Alencar - Os médicos chegaram a essa conclusão há uns dois anos e logo me contaram. E não poderia ser diferente, pois sempre pedi para estar plenamente informado. A informação me tranquiliza. Ela me dá armas para lutar.

Sinto a obrigação de ser absolutamente transparente quando me refiro à doença em público. Ninguém tem nada a ver com o câncer do José Alencar, mas com o câncer do vice-presidente, sim. Um homem público com cargo eletivo não se pertence.

ENTREVISTA:O senhor costuma usar o futebol como metáfora para explicar a sua luta contra a doença. Certa vez, disse que estava ganhando de 1 a 0. De outra vez, que estava empatado. E, agora, qual é o placar?
José Alencar - Olha, depois de todas as cirurgias pelas quais passei nos últimos anos, agora me sinto debilitado para viver o momento mais prazeroso de uma partida: vibrar quando faço um gol. Não tenho mais forças para subir no alambrado e festejar.

ENTREVISTA:Como a doença alterou a sua rotina?
José Alencar - Mineiro costuma avaliar uma determinada situação dizendo que "o trem está bom ou ruim". O trem está ficando feio para o meu lado. Minha vida começou a mudar nos últimos meses. Ando cansado.

O tratamento que eu fiz nos Estados Unidos me deu essa canseira. Ando um pouco e já me canso. Outro fato que mudou drasticamente minha rotina foi a colostomia (desvio do intestino para uma saída aberta na lateral da barriga, onde são colocadas bolsas plásticas), herança da última cirurgia, em julho. Faço o máximo de esforço para trabalhar normalmente. O trabalho me dá a sensação de cumprir com meu dever. Mas, às vezes, preciso de ajuda.

Tenho a minha mulher, Mariza e a Jaciara (enfermeira da Presidência da República) para me auxiliarem com a colostomia. Quando, por algum motivo, elas não podem me acompanhar, recorro a outros dois enfermeiros, o Márcio e o Dirceu. Sou atendido por eles no próprio gabinete. Se estou em uma reunião, por exemplo, digo que vou ao banheiro, chamo um deles e o que tem de ser feito é feito e pronto.Sem drama nenhum.

ENTREVISTA: O senhor não passa por momentos de angústia?
José Alencar - Você deveria me perguntar se eu sei o que é angústia. Eu lhe responderia o seguinte: desconheço esse sentimento. Nunca tive isso. Desde pequeno sou assim, e não é a doença que vai mudar isso.

ENTREVISTA: O agravamento da doença lhe trouxe algum tipo de reflexão?
José Alencar- A doença me ensinou a ser mais humilde. Especialmente, depois da colostomia. A todo momento, peço a Deus para me conceder a graça da humildade. E Ele tem sido generoso comigo. Eu precisava disso em minha vida. Sempre fui um atrevido. Se não o fosse, não teria construído o que construí e não teria entrado na política.

ENTREVISTA: É penoso para o senhor praticar a humildade?
José Alencar - Não, porque a humildade se desenvolve naturalmente no sofrimento. Sou obrigado a me adaptar a uma realidade em que dependo de outras pessoas para executar tarefas básicas. Pouco adianta eu ficar nervoso com determinadas limitações.

Uma das lições da humildade foi perceber que existem pessoas muito mais elevadas do que eu, como os profissionais de saúde que cuidam de mim. Isso vale tanto para os médicos Paulo Hoff, Roberto Kalil, Raul Cutait e Miguel Srougi quanto para os enfermeiros e auxiliares de enfermagem anônimos que me assistem.

Cheguei à conclusão de que o que eu faço profissionalmente tem menos importância do que o que eles fazem. Isso porque meu trabalho quase não tem efeito direto sobre o próximo. Pensando bem, o sofrimento é enriquecedor.

ENTREVISTA: Essa sua consideração não seria uma forma de se preparar para a morte?
José Alencar - Provavelmente, sim. Quando eu era menino, tinha uma professora que repetia a seguinte oração: "Livrai-nos da morte repentina". O que significa isso? Significa que a morte consciente é melhor do que a repentina. Ela nos dá a oportunidade de refletir.

ENTREVISTA: O senhor tem medo da morte?
José Alencar - Estou preparado para a morte como nunca estive nos últimos tempos. A morte para mim hoje seria um prêmio. Tornei-me uma pessoa muito melhor. Isso não significa que tenha desistido de lutar pela vida. A luta é um princípio cristão, inclusive. Vivo dia após dia de forma plena. Até porque nem o melhor médico do mundo é capaz de prever o dia da morte de seu paciente. Isso cabe a Deus, exclusivamente.

ENTREVISTA: Se recebesse a notícia de que foi curado, o que faria primeiro?
José Alencar : Abraçaria minha esposa, Mariza e diria: "Muito obrigado por ter cuidado tão bem de mim".

Sábias palavras.
" Pois, no coração do Prudente descansa a sabedoria".

(Provérbio judaico).

Santa Teresa - ES
15 de julho de 2010.

4 comentários:

  1. Frei,

    Lembra do que eu havia dito sobre a medicina?
    Pois bem, está tanscrito aí um dos meus motivos pra fazê-la, suavizar a dor do próximo, especificamente a oncologia mesmo. Não preciso nem dizer que eu chorei lendo isso, e muito. Milhões de pessoas passando pela mesma coisa e mazelas piores, e um sentimento de impotência, pelo simples fato de não ter um curso sou obrigada a ficar estática, mais que um curso,medicina é uma questão de coração e doação, não é injusto também chamá-la de sacerdócio. Mas aguardemos, sua frase: "O melhor ainda está por vir."

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  2. __________________________

    Exato Lorrany.
    Creio..creio mesmo..
    Tuas palavras dizem...isso é bonito.
    um abraço.
    Escrevendo com letras vivas.
    Salamaleiko.

    ___________________________

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  3. http://www.orkut.com.br/Main#Profile?uid=4102833034056797802sábado, julho 17, 2010

    nap preciso dizer muito, a nao ser emocionante e uma bela lição de vida! isso basta! ;)
    um abraço e muita luz e paz no seu coração!

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  4. Esta entrevista nos leva a reflexão não só em relação às pessoas que estão com câncer, mas também em relação a outros tipos de sofrimentos. O sorriso do nosso vice-presidente nos propõe a louvar também nos momentos difíceis. Sempre paro para observar a maneira como as pessoas reagem a certos acontecimentos e vejo que algumas acham que o mundo acabou quando, por exemplo, pegam uma gripe; outras são capazes de superar tragédias como se fosse uma simples gripe. Penso também que a superação do sofrimento não está no ser rico ou pobre, mas está no quanto de DEUS as pessoas colocam em suas vidas.
    Paz e Bem
    Ana Paula (Paróquia Santo Cristo dos Milagres)

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